sábado, 3 de julho de 2010


Ouvi na mesa do bar:

-Menina... Pois num é que fui no salão da Dinha, dar um tapa no lôro né, ficar bonita pro samba de ontem a noite, e o cidadão me apareceu na porta do salão...Ah mas fiquei muito brava...o sangue correu da ponta do pé até o coro da cabeça...Já fui logo perguntando: “Quié? Ta fazendo o que aqui?” e ele com a cara mais lavada do mundo disse que tava indo ver se eu precisava de alguma coisa, se precisava de algum mimo...ah tu acredita mulher? Eu que não sou boba nem nada, já soltei minha língua logo, porque você sabe que não sou mulher de ficar calada, pois sim, abri minha boca e disse “Olhe, num me venha com esse seu lero-lero não que já conheço teu cheiro é de longe...Fique sabendo que home ninhum me põe cabresto ta ouvindo? Ta me ouvindo seu moço? Olhe aqui mermão, fique sabendo que tenho suingue viu...E só porque tu tá comigo num quer dizer que to nas tuas mãos... quem paga as contas do barraco sô eu e num quero saber de home nenhum no meu pé... Num disse que vinha no salão? Então...Num to aqui?...” E foi juntando gente, e juntando gente, e esse home inflou de um jeito, e veio dar uma de macho pra cima de mim...Há...Logo eu...Mais macho que muito home por aí...criada com 4 irmãos homens...Hum!... Pois eu inflei também, e joguei toda minha marra pra cima do cidadão...e você sabe né nega, que negona que é negona tem que ter marra...Levantei o queixo olhei na cara dele e disse... “Nem ouse levantar esse queixo pra mim que tu sabe quem é que ta certa... E vam’bora junto comigo que você vai sair do meu barraco é agora... E como diria minha mãe, eu vou cuspi no chão quando secar, quero o senhor cantando de galo em outro terreiro!” Ah agora que to bonita mesmo... Me vem o cara malandro como o quê, todo cheio de pinta querer mandar na nega aqui... Comigo não alemão...comigo não...

Garçom...Desce mais uma aí, que hoje quero sambar e beber até cair...

quinta-feira, 1 de julho de 2010

A dor.


Primeiramente escondi, disse que não me importava, que tudo bem. Depois assumi. Xinguei, gritei, rasguei palavras, desperdicei tempo, chorei, bati, calei. Daí veio  a sesação de se estar sem forças, de não se poder fazer nada, de não sentir. E a espera as vezes antecipa a sorte. Senti antes da hora e de tanta espera pelo golpe, quando ele aconteceu já me doía. E passou a doer dobrado. Cuidado com a dor antecipada! Depois veio a fase de romper laços afetivos. Comigo mesma. "Nunca mais quero saber de mim!" E não quis mesmo. Resumi a vida a sobrevivência. Livros, música, filmes. Buscar amigos. Antigos e novos. Não falar sobre isso. Depois falar.Escrever. Planejava terminar este texto dizendo que tudo o que saiu de produtivo deste processo foram estas palavras. Mas não. Tive que me confrontar tão intimamente que acabei descobrindo-me, experimentando-me. E gostei. Apreciei meu gosto, meu cheiro, provei meus pensamentos, desenvolvi alguns, aboli outros. Averiguei que sou mais forte do que eu. "Minha força esta na solidão" Lispector diria. Quando se está dolorido a solidão é um ótimo remédio. É nela que a dor se manisfesta, é nela que travamos a batalha. É preciso estar só as vezes. Essa foi a maior fase. Sobreviver apesar da dor. Mas consegui. Daí foi a hora de fazer as pazes comigo. Me pedir desculpa por ter sido tão negligente e tão dramática. Me perdoei. Era de se esperar. Me amo demais pra ficar tanto tempo longe de mim, e percebi que aquela dor parecia antiga...Tão sem glamour! Não valia a pena sofrer por ela. Me senti meio boba (boba e meio) por ter me depreciado, mas no fundo eu sabia que só estava me sentindo assim, maior que a dor, porque me permiti sofrê-la um dia. E a vida segue.
"Por tanta dor, por tanta emoção, a vida me fez assim. Doce ou atroz manso ou feroz, eu caçador de mim."